53.

Apanharam-me completamente desprevenido. Apareceram logo a seguir à hora do almoço, exactamente quando me dá aquela lambina do aconchego da sopa quente no estomago e não tenho consciência total do que está a acontecer.


Bateram no postigo, nada de campainhas. E eu, moita. Deixei-me estar, podía ser que desistissem. Outra vez, aqueles toques com os nós dos dedos, depois a voz:


Camarada! Camarada Guarda-Livros!


(Isto é comigo?)


Lá fui, uma nesga do postigo e um só olho a ver o que era, mas os gajos escancararam-me a portada e passaram-se para o lado de dentro.


Assustei-me: Queres ver que vêm para roubar o estaminé? AH! Mas isto não fica assim! Que eu por esta merda até dou a vida!


Calma, disseram, somos camaradas do sindicato, viemos saber se está tudo bem! Hã... Está tudo bem... Tudo bem, tudo bem...


Então se está tudo bem por que é que deixaste de pagar as quotas do sindicato?


Hein?


Deve de haver uma maneira qualquer destes tipos perceberem que estamos a atravessar uma crise. E que eu deixei de ter direito a subsidio de almoço. E que o sindicato a levar-me 1% do que ganho ainda contribui mais para a minha pobreza. Mas não. Apareceram agora que o graveto está em falta. Onde estavam quando o patronato me quis pôr um processo disciplinar?

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